O desenvolvimento esplendoroso da antiga polis grega e de Roma, que ofuscaram as épocas subseqüentes, representa um marco de cultura urbana que se sustenta em proporções esmagadoras no campo.
As cidades grego-romanas nunca foram, predominantemente,
comunidades de manufatores, comerciantes ou mercadores. Eram, na suas origens,
agregados urbanos de proprietários de terras. Seus rendimentos provinham do
trigo, do azeite e do vinho, os três artigos clássicos do mundo antigo.
Dentro do perímetro urbano, as manufaturas são poucas e
rudimentares, era normal a produção de têxtil, olaria, mobiliário e vidro. A
técnica era simples, a procura limitada e o transporte caro.
O transporte marítimo era o meio de transporte por
excelência. Não é de se estranhar que a zona Egéia (um labirinto de ilhas,
enseadas e promontórios) tenha sido a pátria da cidade-estado e, que Atenas, seu
exemplo maior, tenha fundado sobre a navegação suas fortunas comerciais. Por seu
turno, Roma, as margens do Rio Tibre, se tenha tornado uma metrópole costeira.
O Mediterrâneo é o único mar interior e a posição única da
Antiguidade Clássica não pode se dissociar deste privilégio físico, ser
mediterrânica. Contudo, o seu conteúdo histórico e, novidade, assenta-se na
relação de produção escravista.
A escravidão sempre existiu no Mundo Antigo, mas formava um
fenômeno residual. Os impérios Orientais (Egito, Mesopotâmia, etc.) não eram
economias escravistas e não tinham uma concepção nítida de propriedade privada
da terra, que permaneceu nas mãos da coletividade.
As cidades-estados gregas tornaram a escravidão, pela
primeira vez na história, absoluta e dominante, transformando-a de recurso
subsidiário em modo de produção sistemático. De qualquer forma o escravismo
clássico conviveu camponeses e artesãos urbanos livres, em combinações
variáveis.
O esplendor da cultura clássica foi testemunho da escravidão
e o declínio do escravismo marcou o fim da época clássica.
Uma pesquisa de 1967, informa que a razão entre escravos e
cidadãos livres, em Atenas, na época de Péricles (454 aC a 429 aC) era de 3:2,
provavelmente de 80 a 100 mil escravos para 45 mil cidadãos livres. Mesmo entre
os grandes filósofos da Antiguidade não havia oposição ao trabalho escravo, pelo
contrário, Aristóteles acreditava que o Estado devia possuir escravos. Xenofonte,
ao elaborar um plano para restaurar as fortunas de Atenas, acredita que o Estado
deveria ter escravos públicos, até que houvesse 3 escravos para cada cidadão
ateniense.
Na Grécia clássica os escravos foram usados regularmente nos
negócios, na agricultura e no artesanato. Enquanto o escravismo tornava-se
dominante, liberava o cidadão para a política, para a filosofia e para as artes.
A cidadania e a escravidão eram indivisíveis, uma era condição da outra.
A escravidão era a mola econômica que unia a cidade e o
campo. A agricultura permitia a diferenciação entre a classe produtora (os
escravos) e a classe dirigente urbana, de origem rural (os proprietários). É o
produto do trabalho escravo que possibilitou o intercâmbio comercial com o
Mediterrâneo.
O preço a pagar pelas relações de produção escravistas foi,
no entanto, muito grande. Ainda que na sua fase inicial, o escravismo foi
responsável pela expansão da economia clássica, difundindo as culturas do vinho,
do azeite e do trigo, introduzindo moinhos rotativos de cereais, criando prensas
de parafusos, desenvolvendo técnicas de produção de vidro, etc., contudo, o seu
desenvolvimento não foi capaz de dar um impulso dinâmico que fosse capaz de
levar a economia a uma nova fase de desenvolvimento.
Perry Anderson, de quem retiramos estas idéias, vê na brutal
diferença entre a vitalidade cultural e política do mundo grego-romano e, na
pobreza da tecnologia e dos meios de produção existentes uma relação de causa e
efeito do escravismo. Uma vez que o trabalho manual esteve sempre ligado à
escravidão não havia incentivo para a produção de tecnologia. Havia um divórcio
tão grande entre o trabalho material (escravo) e a cidadania, que os gregos não
desenvolveram um conceito que designasse trabalho, quer como conduta pessoal
quer como função social.
José Tadeu Cordeiro baseou-se em Perry Anderson, Passagens da
Antiguidade ao Feudalismo.
Interpretando o texto
1.Qual a diferença entre a civilização clássica (Grécia e Roma) e a civilização
Oriental (Egito, Mesopotâmia) na passagem de uma sociedade sem classes para uma
sociedade com classes?
2.Como era a vida econômica das cidades grego-romanas?
3.Por que o autor enfatizou a importância do Mediterrâneo?
4.Qual a importância da produção escravista para o mundo grego-romano?
5.Na análise da Antiguidade Clássica, chama a atenção à diferença entre a
vitalidade cultural (política, filosofia, artes, etc.) e a pobreza tecnológica.
Como o autor explica essa diferença? Como relacionar isso com nossa vida
tecnológica e cultural?