A Batalha do Livro Didático – A Idade das Sombras

Professor Ivan Tavares Scotelari de Souza

 

 

--- IV ---

     A mente do guardião parecia querer explodir. Centenas de anos em descobertas e realizações podiam ser expostos pelas joias de luz. Quase em desespero, o aprendiz procura uma informação que lhe permitisse salvar seu povo. Todos em Tumont temiam que em breve os ignorks atacariam a capital do reino e destruiriam o último elo que mantinham os cultureks unidos. Após isso, a fragmentação de sua civilização seria irreversível.

     As horas se passam. O guardião dormira e comera muito pouco. Apesar da dispensa ainda possuir alimentos, abandonados pelos antigos donos do castelo, não havia tempo para se alimentar corretamente. Aos poucos, foi percebendo que por mais que se dedicasse, não viveria o suficiente para absorver todo o conhecimento guardado nas joias. Precisaria de muita ajuda para esta tarefa, porém não ousaria abandonar o castelo naquele momento. O destino de seu povo estava em suas mãos e as joias de luz mais do que nunca deveriam ser protegidas.

     Mergulhado em seus pensamentos, o aprendiz não percebe um leve brilho que se espalha por sobre as joias em suas estantes. Este tremeluzir aumenta de intensidade e como um relâmpago vindo de várias direções lança-se sobre uma espada presa na parede. Assustado, o guardião tropeça e cai. Fica prostrado alguns segundo no chão observando aquela simples espada que fora colocada na parede de forma ornamental. A luz que percebera por uma fração de segundos sobre as joias desaparecera. Agora, somente a espada brilha, circundada por um halo de luz.

     O guardião aproxima-se da arma reluzente. Em seu íntimo, percebe que tal energia não lhe será perigosa. Decidido, segura a espada e instintivamente a ergue. Um brilho intenso se irradia da lâmina iluminando todo o salão. Ao contrário de cegá-lo, esta luz clareia sua mente de forma assombrosa. Seus medos, receios e dúvidas oriundas de sua ignorância do mundo à sua volta desaparecem como de imediato. O aprendiz percebe que aquela espada continha em seu interior um incrível poder de transformação. O vasto saber dos cultureks invade seu ser permitindo-o compreender que em suas mãos estava a materialização do conhecimento de toda uma civilização. Nem o mais terrível vilão poderia enfrentar tamanha força. Dommagu encontraria seu fim nesta espada de luz. Seu povo e os ignorks não seriam mais oprimidos e subjugados pela sua escuridão.

     Ele fora o responsável pelo despertar da luz na joia primordial ao reunir centenas de joias ao seu redor. Com isso, o encanto maligno de Dommagu havia sido quebrado. O aprendiz do último ancião percebe que a luz das joias flui através de seu ser até alcançar a espada. Com a arma em punho, resolve sair do salão principal do castelo, com o intuito de retornar para capital e apresentar a todos a salvação de seu combalido povo.

     Poucos metros à frente, já fora do salão, o guardião é atingido por uma desagradável surpresa. Subitamente a arma perde seu brilho, voltando a ser um simples metal. Embora aturdido, sua mente aguçada pelas joias de luz o faz entender o significado de tudo aquilo. Ele seria o elo de ligação entre as joias e a espada, devendo permanecer sempre junto a elas. Agora, ao mesmo tempo em que percebe totalmente o significado daquela arma, o guardião compreende também suas limitações. Precisaria que outros cultureks utilizassem aquela ferramenta no combate ao terrível chefe dos ignorks. Não poderia ele, por si só, fazê-lo.

     Perdido em suas divagações, o aprendiz é despertado pelo violento som de batidas no portão principal do castelo. Com passos largos, ele alcança uma janela próxima e olha para baixo na direção da passagem que dá acesso ao seu reduto.

     Alguns jovens cultureks esmurravam em desespero o velho portão de madeira. O medo estava estampado em seus rostos. Continuamente, vários deles olhavam para trás e gritavam por ajuda. Mais ao longe, o guardião descobre o motivo de tanta aflição.

     Em uma pequena elevação no horizonte, dezenas de ignorks fortemente armados e várias criaturas monstruosas se aproximavam rapidamente. Em meio a eles, mais atrás, um homem imponente e arrogante podia ser visto no alto de uma carruagem fortificada. Não era um ignork comum. Era o próprio Dommagu que tanto temor incutia nos cultureks.

     Com um estrondo, o portão cede à força dos jovens e cai ao chão. Estes correm por um pequeno trecho e penetram no castelo. Decidido a auxiliá-los, o guardião vai ao encontro, sabendo que o destino os colocara em seu caminho. Seu corpo e sua mente se preparam para o que está por vir. A derradeira batalha entre os cultureks e os ignorks começaria agora. Uma batalha entre as forças do bem e do mal. Entre as trevas e a luz...