A História 

    Ivan Tavares Scotelari de Souza

    Por volta de 1982, o gênio inglês da eletrônica, Clive Sinclair lança em seu país o micro que seria a paixão de toda uma geração de aficionados pela informática. O ZX Spectrum. Este pequeno computador (mal ultrapassava o tamanho de um livro de porte médio) possuía 16 ou 48K de RAM, um processador de 8 bits com clock 3.58 MHz, um interpretador BASIC incorporado, capacidade de gerar 8 cores, sons tipo BEEP e um slot de expansão na parte posterior para conectar periféricos. Tudo isso colocado em um gabinete de poucos centímetros de espessura (conforme as imagens abaixo).

TK90X (Brasil)

        Os programas eram gravados em forma de som (sinais graves e agudos) em uma fita K-7 com auxílio de um gravador mono comum. O tempo para a transferência de um arquivo em torno de 40K, chegava perto dos inacreditáveis cinco minutos (isso se não ocorresse nenhum problema com a fita ou com o ajuste do cabeçote do gravador).

    Pode parecer uma loucura que alguém se desse ao trabalho de esperar tanto tempo para acionar um programa e ainda tivesse que repetir tudo de novo se os dados não tivessem sido transferidos corretamente, mas naquela época em que os quase inacessíveis PCs 286 ou 386 eram um sonho que poucos realizavam no Brasil; ter um microcomputador em casa era algo capaz de maravilhar muita gente principalmente na Europa onde seu domínio quase era total.

    Mesmo com os "ridículos" 42K disponíveis (nem toda a RAM do micro estava facilmente à disposição), era possível criar incríveis programas no ZX Spectrum. Para os que não conheciam a linguagem ASSEMBLER, o BASIC poderoso do Spectrum permitia a edição de programas bem  satisfatórios sendo que muitos usuários, inclusive eu (veja abaixo), dedicavam várias horas à agradável tarefa de criar e programar.

        O ZX Spectrum foi lançado no Brasil pela Microdigital com o nome de TK 90X. Esta empresa já havia lançado com relativo sucesso outros micros da linha Sinclair tais como o TK 82, TK83 e TK85. Na época existia no país a famigerada reserva de mercado que permitia as indústrias nacionais de informática se vissem livres de concorrentes estrangeiros.

    Em tese era uma idéia até que razoável, porém ao contrário da Microdigital (entre outras) usar esse espaço para se fortalecer e se preparar para uma futura competição internacional; esta se acomodou na venda para um mercado fechado, de produtos mal acabados e até incompletos. O próprio TK 90X era uma cópia inferior do original inglês tanto no acabamento quanto no hardware, sendo que alguns programas eram total ou parcialmente incompatíveis.

    Mas tudo isso não impediu que o TK 90X conseguisse rapidamente uma legião de fãs aficionados e que um sucessor surgisse com toda a pompa: o TK 95. Este apesar do belo visual, nada mais era que um TK 90X com teclado semi-profissional.

    Muitos usuários que cederam a tentação de trocar seu TK 90X pelo TK 95 sentiram-se enganados ao levantarem a tampa do teclado e verem as inscrições TK 90X na placa-mãe do TK95, sendo esta praticamente idêntica ao primeiro.

    O reinado da linha Sinclair no Brasil durou até fins dos anos 90. Nessa época muitos usuários sentiram uma total falta de apoio dado pela Microdigital (principalmente no lançamento de novos periféricos) e começaram a abandonar esta linha de microcomputadores muito antes que na sua terra natal a Inglaterra, onde era prestigiado com milhares de programas e vários periféricos. Neste país o sucesso foi tanto que após o ZX Spectrum 48K, foi lançado o ZX Spectrum 128K, mais avançado que o anterior, com mais memória RAM, um processador de som em 3 canais e chegando a incorporar uma unidade de disk drive em um gabinete bem mais atraente e funcional.

ZX Spectrum 128K

    Infelizmente com o passar dos anos, o ZX Spectrum perdeu força mesmo em seu país de origem. Erros de marketing provocaram enormes prejuízos as indústrias Sinclair sendo a linha Spectrum vendida a outra empresa inglesa que posteriormente encerrou sua fabricação.

    Hoje em dia é inegável o quase total domínio da linha PC, sendo que algumas pessoas que se dizem profundos conhecedores da história da informática desconhecem que microcomputadores como o ZX Spectrum existiram; ou ainda de outras linhas tais como MSX, TRS-Color, AMIGA etc. Não são capazes de compreender como era fascinante desvendar os segredos de seu micro ou de programas que você demorava muito para dominar ou mesmo adquirir. No caso do TK 90X, algumas softhouses do Brasil vendiam programas pelo correio, gravados em fita K-7,  e estes às vezes demoravam mais de dois meses para serem enviados.

    Nos dias atuais somos soterrados por uma infinidade de programas disponíveis para a linha PC e mal nos preocupamos em usufruir do que temos em mãos. Sabemos que um determinado programa "X" logo será sucedido pelo "X2", "X3" etc. Não que isso seja errado e que eu esteja pregando um retrocesso ao passado ou uma paralisação do avanço na área da informática, mas quando ligo o meu PC, percebo que muito do charme daquela época incrível se foi e talvez nunca mais volte.

    Somente quem passou por ela e teve em casa um "pequeno notável", poderá compreender...